De: "Domingueira" <domingueirapoetica@gmail.com>
Data: 13/01/2013 00:11
Assunto: Rubem Braga - 100 anos
Para:
Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.
E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida; que a lembrança deles nos faz sentir maior a nossa solidão; mas que essa solidão ficou menos infeliz: que importa que uma estrela já esteja morta se ela ainda brilha no fundo de nossa noite e de nosso confuso sonho?
Talvez não mereçamos imaginar que haverá outros verões; se eles vierem, nós os receberemos obedientes como as cigarras e as paineiras — com flores e cantos. O inverno — te lembras — nos maltratou; não havia flores, não havia mar, e fomos sacudidos de um lado para outro como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil.
Ah, talvez valesse a pena dizer que houve um telefonema que não pôde haver; entretanto, é possível que não adiantasse nada. Para que explicações? Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes; o silêncio torna tudo menos penoso; lembremos apenas as coisas douradas e digamos apenas a pequena palavra: adeus.
A pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo.
(*) do livro "A Traição das Elegantes", Editora Sabiá – Rio de Janeiro, 1967, pág. 83.
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Data: 13/01/2013 00:11
Assunto: Rubem Braga - 100 anos
Para:
Prezadas/os
Bom dia!
Minha inspiração para essa domingueira veio em cima da hora. Ontem, sábado, navegando pela rede descobri que fazia 100 anos do nascimento de Rubem Braga - e hoje faz 82 da morte de James Joyce. Optei pelo consagrado autor nacional.
Hoje em dia é facílimo encontrar a biografia da qualquer pessoa na Internet. Biografias estas recheadas de um formalismo acadêmico, repetitivo e seco que as permitem serem corte-coladas (Ctrl+c, Ctrf+v) e utlilizadas, mais tarde, até obituário.
Insisti em procurar algo mais original e que agradasse ao Povo da Domingueira sobre quem foi o "Sabiá das Crônicas", apelido cunhado pelo genial Stanislaw Ponte-Preta.
E eis que achei no "Almanaque Brasil", o delicioso texto abaixo escrito por Danilo Ribeiro Gallucci.
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Além deste, encontrei milhares de textos - as más línguas dizem que ele escreveu menos de 15 mil crônicas; as boas mais de 15 mil - e bastava pegar qualquer uma, como se fosse um produto qualquer na prateleira do Supermercado, para cumprir a missão a domingueira. Ok, mas qual critério adotar ?
Para explicar o critério, preciso revelar algo para vcs que há muito tempo descobri, que é o segredo do sucesso dos grandes escritores, coisa bem simples, anotem: Construam frases diferentes. Escrevam o óbvio por linhas tortas de forma que a frase não fique na mesmice, mas que instigue o leitor e o faça deter-se sobre essa frase, reler e sorve-la como se fosse um bom vinho (eu confesso que ainda não consegui escrever assim).
Assim, para justificar a escolha do texto mais abaixo, intitulado "Despedida", do mestre Rubem, as seguintes frases me tocaram profundamente:
(...) melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito...
Eles não se despediram, a vida é que os despediu...
(...) será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa...
(...) a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio...
(...) essa solidão ficou menos infeliz...
E, para que tudo termine bem e ninguém fique triste neste belo domingo ensolarado - mentira, aqui está frio e nublado - o texto abaixo teria um perfeito final feliz se fosse encerrando com uma outra frase avulsa desse grande escritor: [então] "Tudo que nos separava, subitamente falhou" (o "então" é por minha conta!).
Finalizando a domingueira, eu lhes proponho um exercício interessante: respondam para si mesmos quais são as sentenças que mais lhes tocaram, no texto abaixo? Se foram as mesmas que eu selecionei, seremos almas-literárias-gêmeas? Se não, isso não tem a menor importância!
Boa leitura; Bom domingo!
Antonio Pastori
Despedida - Rubem Braga (*)
E no meio dessa confusão alguém partiu sem se despedir; foi triste. Se houvesse uma despedida talvez fosse mais triste, talvez tenha sido melhor assim, uma separação como às vezes acontece em um baile de carnaval — uma pessoa se perda da outra, procura-a por um instante e depois adere a qualquer cordão. É melhor para os amantes pensar que a última vez que se encontraram se amaram muito — depois apenas aconteceu que não se encontraram mais. Eles não se despediram, a vida é que os despediu, cada um para seu lado — sem glória nem humilhação.
Creio que será permitido guardar uma leve tristeza, e também uma lembrança boa; que não será proibido confessar que às vezes se tem saudades; nem será odioso dizer que a separação ao mesmo tempo nos traz um inexplicável sentimento de alívio, e de sossego; e um indefinível remorso; e um recôndito despeito.
E que houve momentos perfeitos que passaram, mas não se perderam, porque ficaram em nossa vida; que a lembrança deles nos faz sentir maior a nossa solidão; mas que essa solidão ficou menos infeliz: que importa que uma estrela já esteja morta se ela ainda brilha no fundo de nossa noite e de nosso confuso sonho?
Talvez não mereçamos imaginar que haverá outros verões; se eles vierem, nós os receberemos obedientes como as cigarras e as paineiras — com flores e cantos. O inverno — te lembras — nos maltratou; não havia flores, não havia mar, e fomos sacudidos de um lado para outro como dois bonecos na mão de um titeriteiro inábil.
Ah, talvez valesse a pena dizer que houve um telefonema que não pôde haver; entretanto, é possível que não adiantasse nada. Para que explicações? Esqueçamos as pequenas coisas mortificantes; o silêncio torna tudo menos penoso; lembremos apenas as coisas douradas e digamos apenas a pequena palavra: adeus.
A pequena palavra que se alonga como um canto de cigarra perdido numa tarde de domingo.
(*) do livro "A Traição das Elegantes", Editora Sabiá – Rio de Janeiro, 1967, pág. 83.
Antonio Pastori, administrador neófito da Domingueira Poética
Para ler e dançar mentalmente: "Tudo que nos separava subitamente falhou" - Rubem Braga.
obs: O site do MPF www.trembrasil.org.br será reformulado em breve!
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